segunda-feira, 9 de setembro de 2013

REPROVAR OU APROVAR?

Eis a questão!

Desde que o prefeito da cidade de São Paulo, Fernando Haddad, anunciou algumas reformas na educação, temos acompanhado e participado de alguns debates. Sob a alegação de que a “aprovação automática não estava dando certo”, a reforma prevê a diminuição dos ciclos para que as reprovações ocorram nos 3º, 6º, 7º, 8º e 9º anos. Também está prevista a recuperação de alunos nas férias e a possibilidade de se carregar dependência (DP), ou seja, a reprovação somente na disciplina que se faça necessária, por fim também será implementada a obrigatoriedade da lição de casa, provas bimes trais e a alteração dos conceitos (insatisfatório, satisfatório e plenamente satisfatório) para notas de 0 a 10.

Diante deste quadro a opinião de diferentes educadores e escritores se divergem. Ambos apresentam seus pontos de vista e argumentam.

Nós entendemos que nenhum professor (sério) comemore a reprovação de um aluno. Ninguém deve ser reprovado por causa de comportamento, mas sim por critérios bem definidos para que se avance nos estudos. E é ai que mora o problema.

Nem sempre a escola tem os critérios bem definidos. A aula fica restrita a cópia da lousa e a resposta das atividades. A prova, quando é aplicada, reproduz o modelo exposto. Ou então, limita-se a repassar aos alunos uma lista de perguntas para que sejam respondidas de acordo com o modelo utilizado. Se um aluno não decorar o que se passou, fica com nota vermelha.

A falta de conhecimento teórico-pedagógico em grande parte dos professores corrobora com este quadro, mas, felizmente, nem sempre é a regra. Também existe a situação em que o professor tem ciência do seu dever, diversifica a metodologia das aulas, aplica diferentes tipos de avaliação e mesmo assim o aluno não consegue ir adiante, porque apresenta algum problema (aprendizagem – na aquisição do conhecimento) ou simplesmente porque não quer aprender.

No caso da primeira hipótese, acreditamos que seja necessário um acompanhamento diversificado. Encaminhamento a um psicopedagogo já é um bom começo! De nada vai adiantar colocar um aluno com dificulda de de aprendizagem em uma sala de reforço com a mesma metodologia. Já na segunda hipótese, o aluno que não demonstra interesse pelo estudo deverá ser reprovado, uma vez que a escola não pode ser um mundo paralelo à sociedade.

Se uma das funções da escola é o seu “preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”, como será esse funcionário que opta pelo que quer fazer, quando quer fazer e como quer fazer?

O que acontece com um funcionário quando faz seu trabalho totalmente errado causando prejuízo para sua equipe e para a empresa?

O que observamos nesses quase dezoito anos de aprovação automática é que a qualidade dos serviços prestados nos diferentes estabelecimentos piorou. São médicos que não tem bagagem mínima de química. Engenheiros com defasagem em matemática, jornalistas com erros crassos de português, advogados com dificuldade de interpretação de textos, professores com defasagem de conteúdo e preguiça de ler, caixas de supermercados e lojas dando troco errado, atendimento mal feito e por ai vai...

A geração de “funcionários folgados” que a progressão automática criou, causou e ainda irá causar muitos prejuízos sociais e econômicos. A falta de responsabilidade e de cidadania ainda vai deixar cicatrizes por todos os lados.

Para o poder público reprovar significa custos, mas será que alguém já calculou os prejuízos que um cidadão mal formado traz para a sociedade?

Muitos educadores sonhadores crucificaram essa atitude do governo paulistano. Dizem que os alunos tem que ter uma escola alegre e que essa atitude vai aumentar a evasão. Eles até podem ter sua parcela de razão, mas é sempre importante lembrar que a escola deve preparar para a vida, para a cidadania e para o trabalho e não é esse o tipo de sociedade em que vivemos. Também não é preciso radicalizar e transformar a escola em um aparelho de tortura. É possível unir uma escola com um

bom projeto pedagógico, aulas diversificadas e até mesmo divertidas em uma ponta e a cobrança na outra ponta. Aluno que não estudar, independente da série ou ciclo, deve ser reprovado.

Talvez tenhamos que considerar a reprovação como um produtor de desigualdade social, pois uma vez reprovado o aluno poderá abandonar a escola. A reprovação, de certa forma, escamoteia as afirmações liberais de igualdade pela instrução, porque interrompe o curso de muitos alunos. Sabemos que o “desenvolvimento humano não volta atrás”, mas sozinho não é capaz de dar ao aluno o conhecimento necessário para diminuir o processo de exclusão ao qual será submetido fora da escola.

Segundo o relatório, de 2010, do Monitoramento da Educação para Todos, da ONU/UNESCO, no Brasil a cada ano são reprovados 7 milhões de estudantes.

Assim como a aprovação automática, a reprovação por si só também não irá garantir a qualidade do ensino. Muito se tem discutido, mas em base ao custo da educação, porém estamos esquecendo que educação não é custo e sim investimento. O que poderia, talvez, garantir o aprendizado seriam medidas sócio-político-educacionais alinhadas a decisões pedagógicas efetivas. Essas são questões ideológicas que afugentam os libe-rais e os neoliberais, visto que para eles tudo se resume em custos.

A repetência poderá gerar problemas futuramente, mas a progressão continuada, implantada a partir da LDB de 1996, já está dando frutos, pois excluiu e continua excluindo milhares de pessoas do processo seletivo, visto que são analfabetos funcionais e não adquiriram competências e habilidades necessárias para suprir a expectativa da sociedade relativamente ao emprego.

Para que não seja uma arma nas mãos de professores menos preocupados é necessário prover condições dignas e acesso e permanência dos alunos na escola, bem como uma melhor preparação dos professores e valorização dos profissionais. Melhorar a formação pedagógica do professor especialista provendo de ferramentas disponíveis para aplicarem no desenvolvimento dos seus alunos, já seria um avanço. De posse dessas ferramentas os professores poderiam repensar a avaliação meramente classificatória, que é injusta e não auxilia em nada. Ela é estática e freia o processo educativo, pois classifica o aluno em aprovado, reprovado, bom ou ruim.

A avaliação tem que ter um objetivo diagnóstico, um momento dialético no processo educacional visando o crescimento da autonomia. A avaliação não pode ser entendida como ponto final de um processo em que tudo poderá ter sido em vão. A questão não é uniformizar o comportamento, mas sim criar condições de aprendizagem e com isso evoluir na construção do conhecimento.

Portanto, a aprovação ou reprovação após um ciclo qualquer tem quer ser meticulosamente repensado em função daquilo que se pretende avaliar no aluno. O que queremos saber?Suas competências e habilidades? Ou se ele é apenas bom ou ruim?

Reprovar por reprovar não vai trazer benefícios, mas aprovar por aprovar também não. Uma coisa é importante dizer. O poder público deve acabar com a aprovação automática, e nós professores precisamos estudar mais, para podermos enfrentar mais um desafio que é: - Aprovar ou reprovar?

Ivan Claudio Guedes
Geógrafo e Pedagogo. Especialista em Gestão Ambiental,
Mestre em Geociências e doutorando em Geologia.
Articulista e palestrante.
icguedes@ig.com.br

Omar de Camargo
Técnico Químico
Professor em Química.
Pós-Graduado em Química.
decamargo.omar@gmail.com


Texto publicado: GAZETA VALEPARAIBANA  (pág. 9)

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