quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Ali Kamel e a esquecida guerra dos livros didáticos

Em 2007 explodiu uma guerra hoje em dia pouco lembrada no Brasil , em torno da comercialização dos livros didáticos e dos cursos apostilados.

Luis Nassif

A cartelização dos grupos de mídia foi o passo inicial do pacto de 2005, que teve como grande mentor o finado Roberto Civita, da Editora Abril, baseado no modelo Rupert Murdoch – o australiano que se mudou para os Estados Unidos e ressuscitou a “imprensa marrom” na chamada grande mídia.

A lógica do pacto era simples e tosca como o jornalismo de Murdoch. Com a Internet, vinham pela frente mudanças radicais trazendo o maior desafio da história para os grupos de mídia, mais do que o advento do rádio e da televisão, porque muito mais difícil de enquadrá-la em regulamentação – como foi o caso da Lei das Concessões, que restringiu a competição e entregava o filé mignon aos grupos já estabelecidos.

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A estratégia murdochiana consistia em criar um clima de guerra, instaurar um macarthismo feroz debaixo do qual caberiam todas as jogadas comerciais necessárias para assegurar a sobrevivência dos grupos de mídia em novos mercados.

Dentro dessa estratégia, em 2007 explodiu uma guerra hoje em dia pouco lembrada, em torno dos livros didáticos e dos cursos apostilados. Considerou-se que o mercado de livros didáticos poderia ser uma das novas frentes dos grupos de mídia, seguindo a picada aberta pelo grupo espanhol do El Pais.

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A Abril entrou no mercado de livros didáticos e cursos apostilados através de uma nova divisão, na qual incorporou as editoras Ática e Scipione, que havia adquirido em sociedade com o grupo francês VIvendi; e a Globo tentou uma sociedade com a UNO, braço do grupo espanhol Santillana.

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Recorreu-se ao macarthismo para afastar competidores.

No caso da Veja, a uma parceria com um site de direita, criado presumivelmente para denunciar infiltração comunista no ensino. Com base no site, a revista publicou uma reportagem sensacionalista denunciando um competidor no mercado de cursos apostilados. Era matéria falsa, baseada em informação desmentida pelo próprio acusado, mas que não foi respeitada na reportagem publicada.

Coube à blogosfera desarmar a armação, denunciando a informação falsa e ndo trechos de livros de história da Ática e da Scipione com as mesmas análises condenadas no material concorrente.

Desmascarada, a revista acabou publicando um “Erramos”, episódio raro em sua história.

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A segunda frente foi conduzida por Ali Kamel, já elevado a diretor da Globo.

Em 18 de setembro de 2007 publicou coluna no jornal O Globo, prontamente reproduzida no Estadão, denunciando o conteúdo subversivo de um campeão de vendas, o coleção “Nova História Crítica”, de uma editora nacional. As denúncias foram repercutidas nos demais veículos da Globo, da revista Época ao Jornal Nacional.

Kamel denunciava o livro por suposta apologia a Mao Tse-tung selecionando a parte que enaltecia Mao:

"Foi um grande estadista e comandante militar. Escreveu livros sobre política, filosofia e economia. Praticou esportes até a velhice. Amou inúmeras mulheres e por elas foi correspondido. Para muitos chineses, Mao é ainda um grande herói. Mas para os chineses anticomunistas, não passou de um ditador."

E sonegava a parte que o criticava:

“Como governante, agiu de forma parecida com Stálin, perseguindo os opositores e utilizando recursos de propaganda para criar a imagem oficial de que era infalível.”

Sobre a revolução cultural chinesa, Kamel mencionava o trecho:

“Foi uma experiência socialista muito original. As novas propostas eram discutidas animadamente. Grandes cartazes murais, os dazibaos, abriam espaço para o povo manifestar seus pensamentos e suas críticas”.

E escondia a crítica:

''O Grande Salto para a Frente tinha fracassado. O resultado foi uma terrível epidemia de fome que dizimou milhares de pessoas. (...) Mao (...) agiu de forma parecida com Stálin, perseguindo os opositores e utilizando recursos de propaganda para criar a imagem oficial de que era infalível.'' (p. 191) ''Ouvir uma fita com rock ocidental podia levar alguém a freqüentar um campo de reeducação política. (...) Nas universidades, as vagas eram reservadas para os que demonstravam maior desempenho nas lutas políticas. (...) Antigos dirigentes eram arrancados do poder e humilhados por multidões de adolescentes que consideravam o fato de a pessoa ter 60 ou 70 anos ser suficiente para ela não ter nada a acrescentar ao país...''

Sobre a revolução russa, o mesmo procedimento:

"É claro que a população soviética não estava passando fome. O desenvolvimento econômico e a boa distribuição de renda garantiam o lar e o jantar para cada cidadão. Não existia inflação nem desemprego. Todo ensino era gratuito e muitos filhos de operários e camponeses conseguiam cursar as melhores faculdades. (...) Medicina gratuita, aluguel que custava o preço de três maços de cigarro, grandes cidades sem crianças abandonadas nem favelas...

E escondia as críticas:

''A URSS era uma ditadura. O Partido Comunista tomava todas as decisões importantes. As eleições eram apenas uma encenação (...). Quem criticasse o governo ia para a prisão. (...) Em vez da eficácia econômica havia mesmo era uma administração confusa e lenta. (...) Milhares e milhares de indivíduos foram enviados a campos de trabalho forçado na Sibéria, os terríveis Gulags. Muita gente foi torturada até a morte pelos guardas stalinistas...''.

No dia seguinte ao artigo de Kamel, o diário El Pais (dono da Santillana), publicou artigo repercutindo internacionalmente a denúncia e afirmando que “el libro de texto ensalza el comunismo y la revolución cultural china”.

No mesmo dia, o ex-Ministro Paulo Renato de Souza (em cuja gestão o livro passou a integrar as obras do MEC) publicou no site do PSDB a informação de que entraria no dia seguinte com representação na Procuradoria Geral da República para retirar a Nova Historia Crítica do mercado.

No seu site pessoal, a informação de que sua consultoria tinha entre seus clientes a Santillana.

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Conseguiram matar um campeão de vendas. Mas o contraponto da blogosfera produziu tal desgaste que a estratégia acabou abandonada, para alívio das editoras e dos autores concorrentes.

Créditos da foto: Arquivo

Texto relacionado: As informações nos livros didáticos

Texto original: CARTA MAIOR

sábado, 10 de janeiro de 2015

Educação de Supermercado III

Por Antônio Carlos Vieira

A Educação no Brasil se tornou uma mercadoria qualquer e a cada dia mostra exemplos que reforçam essa afirmação! Mesmo antes do advento da Internet, os nossos colégios, principalmente os colégios da Rede Privada, já se organizavam a vender a Educação como uma mercadoria em qualquer supermercado. Com a internet a semelhança entre a venda do que chamamos de educação e outra mercadoria qualquer ficou ainda mais consistente.

Vejamos alguns argumentos:

Atualmente as mercadorias são ofertadas pela internet e isso inclui as matriculas dos alunos para o ano seguinte. Pode-se alegar que as matriculas nas escolas somente são ofertadas no final do ano! Estranhamente é o período onde mais se faz oferta para venda de mercadoria e também é o período que mais se vende!

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

É preciso saber ler e escrever?


Desde os primórdios, da existência da humanidade, a necessidade de comunicação entre as pessoas foi uma exigência. Essa exigência se tornou ainda maior com a criação da escrita. No início não existia exigência e necessidade de se aprender ler e escrever. Com o decorrer da história essa exigência surgiu, foi aumentando e se tornou obrigatória em praticamente todas as sociedades. Ironicamente, nos dias atuais, com a modernidade o cidadão não precisa aprender ler e escrever, as máquinas (diversos tipos de computadores) já fazem isso. Hoje uma pessoa pode viver na sociedade, ter acesso às informações, usar máquinas para ler e escrever e sem a necessidade de ser alfabetizado. Para entender melhor vamos ver uma pequena passagem por vários períodos de nossa história sobre a necessidade de se ler e escrever:

No período das cavernas

O homem das cavernas não tinha a necessidade de se usar a escrita e consequentemente a leitura no dia a dia. As pessoas viviam em grupo e os instrumentos de se materializar a escrita ainda não existiam. Alguns elementos registravam de maneira artesanal as ações do dia a dia das comunidades, em forma de desenhos, nas paredes das cavernas. Não se sabe se esses artesões e desenhistas tinham a intensão de registrar para o futuro essas ações ou se faziam por prazer da arte de desenhar.

Os registros eram feitos com pinturas (usavam tintas retiradas das árvores), fazendo ranhuras nas rochas e devido à simplicidade, do material usado, os desenhos também eram simples e transmitiam ações simples.

Surgimento das primeiras cidades

Mesmo depois do surgimento das primeiras cidades e aprimoramento da escrita, poucas pessoas tinham habilidade e sabiam ler e escrever. Esse pequeno número de pessoas que tinham acesso eram decorrentes das dificuldades de acesso as meios de registar a escrita da época. Toda escrita era feita esculpida em pedras, madeiras, pequenas tábuas feitas de barro e em peles de animais (pergaminhos).

As sociedades já se organizavam escrevendo as leis, deixando escrito o modo de vida e já cronometravam a história da sociedade. Embora ainda fosse difícil o acesso, à escrita e à leitura, já existia uma necessidade da existência de pessoas especializadas em registrar os fatos (os primeiros historiadores) em forma de escrita para posterior leitura. Portanto as necessidades da sociedade já exigiam certa quantidade de indivíduos sabendo ler e escrever.

Invenção do papel (papiro)

Com a criação do papel, material de fácil acesso e manuseio para escrita, também cresceu o número de pessoas na sociedade sabendo ler e escrever e foi  quando surgiram os primeiros livros. Passaram a serem registrados as leis, o movimento do comércio, organização social e melhor registro das ações no decorrer do tempo. Portanto se exigindo cada vez mais e criando a necessidade que os cidadãos aprendessem o ofício da leitura.

Com a invenção do papel foi aumentando em milhares de vezes o número de pessoas sabendo ler e escrever, mas ainda não o suficiente para que todos os participantes destas sociedades tivessem acesso e necessidade deste ofício. Os livros ainda eram difíceis de fabricarem, muito caro e difícil aquisição para o poder de comprar da grande maioria da população. Só as pessoas consideradas ricas tinham condições de adquirir livros!

A invenção da imprensa

Com a invenção da imprensa foi criado facilidade de acesso à escrita e leitura por quase totalidade da sociedade. Os livros passaram a ser produzidos em séries, com baixo custo e podendo ser adquiridos praticamente por todas as pessoas da sociedade. Até mesmo pessoas com deficiência visual ou mesmo auditiva passou a ter acesso e necessidade de se aprender ler e escrever.

O poder público passou a registar todas as ações: leis, projetos de construções, política e até fatos cotidianos do dia a dia nos livros. Isso criou a necessidade para que todos os cidadãos aprendessem a ler e escrever e ter convivência da nova sociedade. Para se viver na atual sociedade passou a ser exigida comprovação de estudos para praticamente todas as profissões!

Escrita digital ou virtual

Com a invenção do computador pessoal se tornou possível o acesso à escrita e leitura para todas as pessoas da sociedade. Quando digo todas, estou incluindo os deficientes visuais e auditivos. As possibilidades de aprender ler e escrever se tornaram imensas e o acesso à informação se tornou maior com a criação das redes de computadores (Internet).

Todas as informações que antes eram guardadas em forma de livros passaram a serem ofertadas através das redes de computadores e a necessidade, também facilidade, para que o cidadão tenha acesso às informações se tornaram maiores.

Estes computadores se tornaram tão avançados que até as pessoas deficientes visuais passaram a ter acesso a leitura e escrita sem a necessidade de se saber braile (corre o risco de desaparecer). Foram criados programas que fazem a leitura e escrita digital para os deficientes visuais.

Existem programas de computadores feitos especialmente para leitura dos textos digitais e também programas para gravação, em forma de texto, da voz humana!

O analfabeto é um deficiente visual !

Anel digital que faz a leitura de textos
em vários idiomas.
As pessoas que não sabem ler e escrever tem o mesmo problema que o deficiente visual. O deficiente não lê diretamente a escrita por não poder ver e o analfabeto por não saber interpretar a escrita. Podemos dizer que o analfabeto é um deficiente visual em relação à escrita. Mas devido o grau de perfeição dos atuais meios, de escrita e leitura digital, os dois passaram a ter acesso às informações de maneiras iguais: é só utilizar os computadores.

O avanço da tecnologia criada para dar condições ao deficiente visual ter acesso à leitura e escrita chegou a uma perfeição onde as pessoas, deficiente visual ou não, pode ler e escrever mesmo sendo analfabeta!

Textos relacionados:
Anel digital lê livros para deficientes visuais
CPqD lança app que ‘fala’ o que está na tela do celular a deficientes visuais

Antônio Carlos Vieira
Licenciatura Plena - Geografia (UFS)
http://carlos-geografia.blogspot.com.br